A disfagia, definida como dificuldade de deglutição, pode ser causada por diversas condições neurológicas que afetam os mecanismos de controle da deglutição. A compreensão da neurofisiologia por trás da deglutição e a realização de uma avaliação neurológica detalhada são essenciais para identificar a causa da disfagia e implementar intervenções eficazes. Este artigo explora a base neurofisiológica da deglutição, as principais doenças neurológicas associadas à disfagia e os métodos de avaliação neurológica mais utilizados.
Neurofisiologia da Deglutição
A deglutição é um processo complexo que envolve a coordenação entre estruturas anatômicas e o sistema nervoso central e periférico. Esse processo pode ser dividido em três fases principais:
1. Fase Oral
A fase oral é voluntária e controlada pelo córtex motor. Durante esta etapa, os músculos da língua e das bochechas, controlados pelos nervos cranianos (como o nervo hipoglosso e o nervo trigêmeo), são ativados para mover o bolo alimentar em direção à faringe.
2. Fase Faríngea
Esta fase é reflexa e coordenada pelo tronco encefálico, particularmente pelo núcleo do trato solitário (NTS) e o núcleo ambíguo. O reflexo de deglutição é acionado quando o bolo alimentar atinge os receptores sensoriais na orofaringe. A proteção das vias aéreas é essencial nesta etapa, e isso é mediado por movimentos precisos da epiglote e pelo fechamento das pregas vocais.
3. Fase Esofágica
Também reflexa, esta fase é coordenada pelo sistema nervoso entérico e pelo nervo vago. O bolo alimentar é empurrado para o estômago por ondas peristálticas, enquanto o esfíncter esofágico inferior relaxa para permitir a passagem do alimento.
Principais Condições Neurológicas Associadas à Disfagia
A disfagia em pacientes neurológicos é frequentemente causada por condições que afetam o controle motor e sensorial da deglutição. As principais condições incluem:
1. Acidente Vascular Cerebral (AVC)
O AVC é uma das causas mais comuns de disfagia. Lesões no córtex motor, tronco encefálico ou cerebelo podem interferir na coordenação da deglutição. A disfagia pós-AVC pode aumentar o risco de aspiração e pneumonia.
2. Doença de Parkinson
Pacientes com Parkinson apresentam dificuldades nas fases oral e faríngea devido à bradicinesia e rigidez muscular. Além disso, a disfunção autonômica pode impactar a motilidade esofágica.
3. Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA)
A ELA afeta os neurônios motores superiores e inferiores, resultando em fraqueza muscular generalizada. A disfagia em pacientes com ELA progride rapidamente e pode requerer intervenções invasivas, como gastrostomia.
4. Traumatismo Cranioencefálico (TCE)
O TCE pode causar disfagia devido a lesões difusas no sistema nervoso central. Esses pacientes frequentemente apresentam dificuldades na proteção das vias aéreas e no controle do reflexo de deglutição.
5. Esclerose Múltipla
Na esclerose múltipla, a disfagia ocorre devido a lesões desmielinizantes no tronco encefálico e no córtex motor. A severidade dos sintomas varia de acordo com a progressão da doença.
Avaliação Neurológica em Pacientes Disfágicos
A avaliação neurológica é uma etapa fundamental no diagnóstico e manejo da disfagia. Ela inclui uma combinação de exames clínicos, avaliações funcionais e exames complementares.
1. Anamnese
Uma anamnese detalhada é essencial para entender o histórico do paciente, incluindo sintomas de disfagia, doenças pré-existentes e eventos neurológicos recentes. Perguntas sobre engasgos, perda de peso, aspiração e dificuldades específicas na deglutição ajudam a direcionar o diagnóstico.
2. Exame Clínico
O exame clínico avalia os nervos cranianos envolvidos na deglutição. O fonoaudiólogo e o neurologista avaliam a função motora e sensorial da língua, faringe, laringe e músculos do pescoço. Observações sobre a qualidade da voz, controle salivar e reflexos de deglutição também são importantes.
3. Exames Instrumentais
Exames instrumentais são usados para avaliar a dinâmica da deglutição em tempo real. Os principais incluem:
- Videofluoroscopia da Deglutição (VFD): É o padrão-ouro para avaliação da deglutição. Permite a visualização das fases oral, faríngea e esofágica.
- Endoscopia da Deglutição (FEES): Proporciona uma visão detalhada da faringe e da laringe durante a deglutição. É útil para avaliar aspiração e penetração laríngea.
4. Testes Neurológicos Complementares
Testes neurológicos ajudam a identificar a origem do problema. Exames como ressonância magnética (RM) e tomografia computadorizada (TC) podem detectar lesões cerebrais ou estruturais associadas à disfagia. A eletroneuromiografia (ENMG) pode ser usada para avaliar disfunções neuromusculares.
Estratégias de Tratamento Baseadas na Avaliação Neurológica
O tratamento da disfagia em pacientes neurológicos deve ser individualizado e baseado nos achados da avaliação. As estratégias incluem:
1. Reabilitação Fonoaudiológica
Exercícios específicos e manobras terapêuticas são indicados para melhorar a força muscular e a coordenação da deglutição. Exemplos incluem:
- Exercícios de Shaker: Melhoram a força dos músculos suprahióideos.
- Manobra de Mendelsohn: Ajuda a prolongar a elevação da laringe durante a deglutição.
2. Modificação da Dieta
A consistência dos alimentos pode ser ajustada para reduzir o risco de aspiração. Alimentos espessados e líquidos viscosos são frequentemente recomendados.
3. Intervenções Invasivas
Em casos graves, pode ser necessária a colocação de uma sonda nasogástrica ou gastrostomia para garantir a nutrição do paciente.
Conclusão
A compreensão da neurofisiologia da deglutição e a realização de uma avaliação neurológica detalhada são passos fundamentais no manejo de pacientes disfágicos. Essas avaliações permitem a identificação precisa da causa da disfagia e a implementação de estratégias terapêuticas eficazes, garantindo segurança e qualidade de vida aos pacientes.
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